A política externa do Brasil vem se aliando a países ultraconservadores islâmicos no que se refere aos direitos e a saúde sexual e reproductiva das mulheres brasileiras. Jacqueline Pitanguy aborda essa questão em seu artigo A cruzada contra as mulheres brasileiras. Em nome de quem fala o Brasil ao adotar tais posições nas Nações Unidas?, publicado no Jornal Folha de São Paulo, em 09 de setembro.
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A Cruzada contra as mulheres brasileiras : O Brasil na ONU
Jacqueline Pitanguy
Socióloga
Foi Presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher
Em um primeiro momento as forças que sustentam movimentos ultra conservadores parecem ser heterogêneas e dispersas. Um olhar atento revela que essas forças estabelecem articulações inusitadas como as alianças do Brasil com Arábia Saudita, Bahrein, Catar, Paquistão, Egito Afeganistão, Sudão no Conselho de Direitos Humanos da ONU. Único país ocidental nessa articulação o Brasil, que professa majoritariamente o Cristianismo, aliou-se a países islâmicos e ultra conservadores . onde as mulheres são ainda cidadãs de segunda categoria. É importante que as mulheres brasileiras, cidadãs com plenos direitos, saibam que na esfera das Nações Unidas ,é com esses países que o Brasil se alia em temas relativos aos seus direitos humanos.
Em nome de quem fala o Brasil ao adotar tal posição?
Em reunião do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, cujo tema principal era a aprovação de resolução proposta pelo México sobre a discriminação contra mulheres e meninas o Brasil , aliado a esses países , se colocou contra a inclusão de parágrafos inteiros que recomendavam o acesso a informações e métodos contraceptivos., o acesso a direitos e saúde sexual livre de coerção, e discriminação, assim como contra textos relativos a prevenção e tratamento de infecções sexualmente transmissíveis e acesso ao aborto legal. A delegação do Brasil nessa reunião ainda se posicionou contra a inclusão do direito ao acesso universal a educação sexual.
Em nosso país, milhões de brasileiras exercem direitos assegurados na Constituição e em legislações nacionais relativos a sua vida sexual e reprodutiva.
Utilizam métodos contraceptivos, recorrem a serviços de saúde para tratar infeções sexualmente transmitidas, podem optar por recorrer ao abortamento seguro realizado em condições medicas e sanitárias adequadas se são vitimas de estupro, correm risco de vida ou se o feto é anencefálico.
Em nome de quem fala o Ministério de Relações Exteriores ao se colocar contra direitos assegurados as cidadãs brasileiras? Será que fala apenas em nome de radicais fundamentalistas como os que negaram a uma menina de 10 anos o direito de interromper uma gestação resultante de estupro?
É importante aproximar essas posições do governo em foros internacionais do quotidiano das mulheres e meninas brasileiras, alertar para o fato de que politica externa e politicas publicas nacionais se entrelaçam atualmente em uma coreografia perversa de negação de direitos.
O silencio do Brasil no Conselho de Direitos Humanos ao se abster junto com o Qatar, a Líbia e o Afeganistão de votar, e aprovar a resolução, aceita pela maioria dos governos, contra a discriminação de mulheres e meninas e pelos seus direitos sexuais e reprodutivos , não é neutro. É um silencio que ecoa marcando sua parceria com países que se caracterizam pela submissão das mulheres. É um silencio que nos envergonha.
Em nome de quem o Brasil se empenha em destruir o que foi assegurado em documentos internacionais e regionais assinados em outros governos, contrariando inclusive leis e politicas publicas vigentes no país ?
Trata-se de uma cruzada contra os direitos e a saúde sexual e reprodutiva das mulheres. Em nome de quem cavalgam esses cruzados ?